domingo, 24 de agosto de 2025

Morre o cartunista Jaguar, um dos fundadores do Pasquim, aos 93 anos


 Sérgio de Magalhães Gomes Jaguaribe, conhecido como Jaguar, morreu aos 93 anos no domingo (24/8). Ele estava internado no hospital Copa D’Or, no Rio de Janeiro, havia três semanas, tratamento uma pneumonia.

Jaguar foi um dos fundadores do Pasquim, jornal de sátiras e charges que enfrentou a ditadura militar. Ele começou a carreira desenhando para a revista Manchete, em 1952, quando tinha 20 anos.

O apelido foi adotado após sugestão do cartunista Borjalo. Na ocasião, Jaguar trabalhava no Banco do Brasil, subordinado ao cronista Sérgio Porto, que o convenceu a deixar o emprego para seguir carreira no humor.

Nos anos 1960, o artista se tornou um dos principais cartunistas da revista Senhor. Ele também passou pela Revista Civilização Brasileira, Revista da Semana, Pif-Paf e os jornais Última Hora e Tribuna da Imprensa.

Jaguar também tem passagem pela literatura. Seu primeiro, chamado Átila, Você é Bárbaro, foi lançado em 1968. Com ironia, a obra combate o preconceito e a violência.

Fundação do Pasquim

Em 1969, Jaguar fundou o Pasquim, ao lado de Tarso de Castro e Sérgio Cabral. O jornal, com sede no Rio de Janeiro, na gráfica Tipológica na Lapa, marcou a imprensa por enfrentar a ditadura militar brasileira.

O Pasquim

Um marco na carreira de Jaguar, assim como na de tantos outros cartunistas brasileiros, o semanário O Pasquim foi fundado em junho de 1969, durante um dos períodos mais difíceis da ditadura militar (1964-1985) - vale lembrar que o Ato Institucional Número 5 havia sido decretado por Costa e Silva no ano anterior.

A fundação de O Pasquim logo depois do AI-5 foi uma coisa inteligentíssima, né? [Risos]. Um grupo de pessoas consideradas de um certo QI, esperou o AI-5 pra abrir um jornal pra falar mal do Governo! Foi uma ideia brilhante! [Risos] Deu tanto resultado que, seis meses depois, 80% da redação estava em cana”, ironizava.

O pontapé inicial foi dado ao lado de Sérgio Cabral, Claudius Carlos Prósperi e Tarso de Castro. Na equipe da publicação passaram ainda outros nomes históricos do jornalismo alternativo como Millôr Fernandes, Ziraldo, Henfil, Paulo Francis, Ivan Lessa e Sérgio Augusto. O nome do jornal foi sugestão do próprio Jaguar, uma referência ao termo italiano Paschino, um panfleto difamador.

Nós fizemos o jornal porque estava todo mundo demitido e a gente precisava de um meio de ganhar dinheiro. Queríamos produzir um informativo de Ipanema, feito nos botecos, mas, pela própria natureza dos participantes, começamos a fazer aquele brincadeira toda”. Em seu auge, O Pasquim chegou a vender mais de 200 mil exemplares numa única edição. A maioria das páginas não surgia de reuniões de pauta formais, mas de conversas de bar.

Foi em sua época de Pasquim que acabou preso, no segundo semestre de 1970. À época, o jornal fez uma sátira com o quadro Independência Ou Morte, de Pedro Américo, na qual, em vez da famosa frase, Dom Pedro dizia: “Eu quero é mocotó!” [Referência à música de Erlon Chaves].

Na semana em que parte da redação foi para a prisão (ou ficou “gripada”, termo que usavam para falar sobre a situação por conta da censura), Jaguar tinha viajado para pescar em Arraial do Cabo. Na volta, foi aconselhado a se esconder. “Pra você ver como o Brasil é surrealista, eu fiquei na casa do sujeito que era um dos mais reacionários: [o apresentador] Flávio Cavalcanti. Ninguém iria procurar um subversivo na casa do Flávio Cavalcanti [Risos]”, lembrava à ABI.

Posteriormente, Paulo Francis, que estava preso, lhe ligou, pedindo para que se entregasse, “caso contrário, ninguém seria solto”. Foi junto a Sério Cabral, que também estava foragido, e se entregaram. Ao longo das décadas, Jaguar se acostumou a relatar de forma bem-humorada o período em que passou na cadeia, como os frequentes subornos aos guardas para que pudesse beber cachaça diariamente na cela. “O Ziraldo fica puto quando começo a contar essas histórias engraçadas, pois ele acha que elas estragam a nossa imagem pública. ‘Pô, você fica nos esculhambando, todo mundo fica rindo... Parece que foi uma brincadeira! Não era, eu sei disso”, ponderava. Mas o tempo de cadeia nos anos de chumbo era só um entre tantos outros assuntos dos quais Jaguar falava dando risada.

Ainda sobre a época da ditadura, relembrava a forma encontrada pelo Pasquim para tentar driblar a censura, que se intensificou em 1974: “O negócio ficou feio, pois tudo tinha que ser mandado pra Brasília. A gente colocava um monte de secretárias copiando Os Sertões, Rachel de Queiroz... Então, de cada 20 páginas, apenas três eram de O Pasquim. Só que eles [censores] tinham que ler aquela merda toda, entendeu? Censuravam Rachel, Fernando Sabino, Rubem Braga [Risos]. Era uma guerrilha, a gente fazia isso muito bem. Mandávamos um volume de material que daria pra três edições, torcendo pra que, após os cortes, o que voltasse salvasse pelo menos uma”.

Mesmo com a tática, os atrasos começaram a se tornar as recentes, fazendo com que a publicação perdesse parte da sua atualidade. “Foi aí que começou a decadência. Fora aquela história de incêndios e explosão nas bancas”. O semanário continuaria sendo publicado até outubro de 1991, época em que o povo já votava diretamente para presidente, e as vendas estavam longe de serem as mesmas dos tempos áureos.

A democracia é péssima para esse tipo de publicação. A gente esculhambava o Governo. E só a gente, né? A chamada 'imprensa nanica'. Depois que todo mundo pôde esculhambar o Governo, virou zona. A democracia é a pior coisa para um jornal de humor e de sátira, do ponto de vista econômico”, analisava Jaguar.

Morreu uma grande parte da história do jornalismo 'sagaz' brasileiro!