domingo, 27 de junho de 2021

JUSTIÇA CONDENA EX-PREFEITO DE MARICÁ A 3 ANOS E 2 MESES PELA QUEDA DO AVIÃO DO JUIZ FEDERAL

 


Foi condenado há 3 anos, dois meses e 15 dias, o ex-prefeito Washington Siqueira (o Quaquá), pela queda do avião na lagoa de Araçatiba após ser impedido de pousar no (na época) aeródromo de Maricá, causando a morte do piloto e instrutor de voo e o seu aluno, um juiz federal que estavam na aeronave, além de outros crimes no mesmo local.

Na mesma sentença foram condenados a 2 anos, 8 meses e 24 dias, o atual vice-prefeito de Itaboraí, Lourival Casula e a 2 anos e 4 meses, o atual secretário de Defesa Civil de Maricá, Fabrício Bittencourt.

Diz a inicial:

"A primeira denúncia (fls. 405/416 do evento 140) foi originariamente oferecida em 3/8/2016, no TRF-2ª Região, pela Procuradoria Regional da República da 2ª Região, em razão do foro por prerrogativa de função de que era detentor o então Prefeito de Maricá Washington Luiz Cardoso Siqueira. Na cota à denúncia, o MPF alegou que o fundamento da competência da Justiça Federal para o processo e o julgamento do feito residiria na tutela do bem jurídico transporte aéreo, cuja exploração compete à União (fls.417/419 do evento 140). Além disso, o MPF requereu a unidade de processo e julgamento em relação ao denunciado Lourival Casula Filho, que não detinha foro por prerrogativa de função, em virtude da existência de conexão entre a conduta dos dois denunciados e da necessidade de preservação da instrução criminal, sendo que os outros envolvidos seriam denunciados na primeira instância.

De acordo com a primeira denúncia, em 17/10/2012, o então Prefeito de Maricá Washington Luiz Cardoso Siqueira, conhecido como Washington Quaquá, firmou o Convênio de Delegação nº 09/2012 com a União, por intermédio da Secretaria de Aviação Civil da Presidência da República, para a exploração do aeródromo localizado naquele município, passando, com isso, a arcar com as despesas relativas à sua ampliação, reforma, administração e operação. No entanto, estavam excluídas do convênio as atividades de navegação aérea relacionadas à operação do aeródromo, as respectivas tarifas e a totalidade da área e dos bens necessários à sua execução. Neste cenário, não obstante essa cláusula vedando qualquer interferência na navegação aérea, o Prefeito Washington editou o Decreto nº 171/2013, determinando o fechamento do aeródromo de Maricá para pousos e decolagens por prazo indeterminado, e designou o seu Secretário de Desenvolvimento Econômico Lourival Casula Filho para que adotasse as medidas necessárias. Dentre essas medidas, Lourival não só teria promovido o fechamento dos portões de acesso ao aeródromo e às suas dependências, inclusive hangares de guarda e manutenção de aeronaves, como também teria bloqueado o acesso das aeronaves às pistas de pouso e decolagem, valendo-se de viaturas da guarda municipal e de servidores contratados, em sua maioria policiais. Por conta disso, segundo a acusação, aeronaves foram impedidas de pousar ou só o fizeram depois de novas tentativas e após arremeterem diante da aproximação perigosa das viaturas que, em alguns momentos, chegaram a invadir a própria pista de pouso e abordar os pilotos que eram impedidos de decolar sem a autorização expressa do Secretário Lourival. Sendo assim, para a acusação, Washington e Lourival, mais de uma vez, expuseram a perigo concreto de acidente aeronaves e seus tripulantes que se viam obrigados a fazer manobras evasivas para evitar a colisão com as viaturas que se encontravam na pista, situação agravada pelo fato de que o fechamento da pista teria ocorrido de forma arbitrária e sem o conhecimento dos órgãos responsáveis pelo tráfego aéreo. Ainda segundo a denúncia, foi nesse contexto que ocorreu o acidente, no dia 21/10/2013, com a aeronave PT-KGK que vitimou fatalmente o instrutor de voo Adelmo Louzada de Souza e o seu aluno Carlos Alfredo Flores da Cunha (fato 1). A aeronave, que apresentava problemas no bimotor, teria arremetido para evitar a colisão com os automóveis, o que a teria desgastado ainda mais e gerado a sua queda e a morte dos tripulantes. E foi também nesse contexto que, no mesmo dia 21/10/2013, Washington e Lourival, por intermédio dos guardas municipais, expuseram a perigo a aeronave pilotada por Pablo Nóbrega, que igualmente teria arremetido por conta do risco de colisão com os automóveis (fato 2). Além disso, dias antes, em 27/9/2013, nas mesmas condições descritas, Washington e Lourival teriam exposto a perigo de dano a aeronave comandada pelo piloto e instrutor de voo Pedro Correia Guimarães (fato 3). Por fim, a denúncia concluiu que Washington, na condição de Prefeito, se omitiu quanto ao dever de garantir os níveis de segurança exigidos pela legislação federal, mantendo o aeródromo de Maricá em situação de abandono, o que teria contribuído para expor aeronaves a risco de dano concreto em outros episódios, inclusive com ameaças a pilotos em pleno voo (fato 4). Por esses quatro fatos, o MPF imputou a Washington Luiz Cardoso Siqueira a suposta prática do crime do art. 261, por quatro vezes, na forma do art. 71, um deles c/c art. 263, todos do Código Penal, e a Lourival Casula Filho, a suposta prática do crime do art. 261, por três vezes, na forma dos arts. 29 e 71, um deles c/c art. 263, todos do Código Penal." 

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Sentença condenatória

Ante o exposto, julgo parcialmente procedente a pretensão punitiva estatal, para: 

a) condenar Washington Luiz Cardoso Siqueira, qualificado nos autos, à pena de 3 anos, 2 meses e 15 dias de reclusão, pela prática de dois crimes previstos no art. 261, caput, do Código Penal, na forma do art. 71 do Código Penal (fato envolvendo o piloto Pablo Eduardo da Silva Nóbrega, em 21/10/2013, e fato envolvendo o piloto Pedro Correia Guimarães, em 27/9/2013);

b) absolver Washington Luiz Cardoso Siqueira da acusação da prática de um crime previsto no art. 261 do Código Penal (fato envolvendo a queda da aeronave PT-KGK, em 21/10/2013), com fundamento no art. 386, III, do CPP; e da acusação da prática de um crime previsto no art. 261, caput, do Código Penal (omissão de segurança em outros episódios), com fundamento no art. 386, VII, do CPP, por não existir prova suficiente para a condenação;

c) condenar Lourival Casula Filho, qualificado nos autos, à pena de 2 anos, 8 meses e 24 dias de reclusão, pela prática de dois crimes previstos no art. 261, caput, do Código Penal, na forma do art. 71 do Código Penal (fato envolvendo o piloto Pablo Eduardo da Silva Nóbrega, em 21/10/2013, e fato envolvendo o piloto Pedro Correia Guimarães, em 27/9/2013);

d) absolver Lourival Casula Filho da acusação da prática de um crime previsto no art. 261 do Código Penal (fato envolvendo a queda da aeronave PT-KGK, em 21/10/2013), com fundamento no art. 386, III, do CPP;

e) condenar Fabrício Soares Bittencourt, qualificado nos autos, à pena de 2 anos e 4 meses, pela prática de dois crimes previstos no art. 261, caput, do Código Penal, na forma do art. 71 do Código Penal (fato envolvendo o piloto Pablo Eduardo da Silva Nóbrega, em 21/10/2013, e fato envolvendo o piloto Pedro Correia Guimarães, em 27/9/2013);

f) absolver o réu Fabrício Soares Bittencourt da acusação da prática de um crime previsto no art. 261 do Código Penal (fato envolvendo a queda da aeronave PT-KGK, em 21/10/2013), com fundamento no art. 386, III, do CPP; e da acusação da prática de um crime previsto no art. 261, caput, do Código Penal (fato envolvendo o piloto Nilson Ribeiro de Melo, em 7/10/2013), com fundamento no art. 386, VII, do CPP, por não existir prova suficiente para a condenação;

g) absolver os réus Paulo César da Costa Gomes, Leandro Pereira de Oliveira, Thiago de Souza Adão, Thadeu Peixoto da Silva, Renato Luiz Azevedo Brandão, Fernando César Ribeiro Mentzingen e Moacyr Winder Duarte Azevedo Brandão, qualificados nos autos, da acusação da prática de três crimes previstos no art. 261, caput, do Código Penal (fato envolvendo o piloto Pedro Correia Guimarães, em 27/9/2013; fato envolvendo o piloto Pablo Eduardo da Silva Nóbrega, em 21/10/2013; e fato envolvendo o piloto Nilson Ribeiro de Melo, em 7/10/2013), com fundamento no art. 386, VII, do CPP, por não existir prova suficiente para a condenação, e da acusação da prática de um crime previsto no art. 261 do Código Penal (fato envolvendo a queda da aeronave PT-KGK, em 21/10/2013), com fundamento no art. 386, III, do CPP.

Nos termos da fundamentação, o regime prisional inicial, para os três réus condenados, é o aberto, não havendo detração a ser feita na forma do art. 387, § 2º, do CPP, uma vez que os réus responderam soltos na fase extrajudicial e no curso do processo penal.

É recomendável a substituição da pena privativa de liberdade por duas penas restritivas de direitos, para cada um dos três réus condenados, consistentes em: a) prestação de serviços à comunidade, mediante atribuição de tarefas gratuitas aos sentenciados, conforme suas aptidões, e que serão cumpridas à razão de uma hora de tarefa por dia de condenação, por 7 horas semanais, indicada a instituição beneficente e fixado o modo de cumprimento, em sede de execução penal, de forma a não prejudicar sua jornada normal de trabalho; e b) prestação pecuniária, em valor a ser fixado em sede de execução penal, a ser depositada na conta única nº 0174.013.41403-3, na Caixa Econômica Federal, à disposição deste Juízo, e, posteriormente, revertida a uma instituição beneficente, na forma da Resolução nº CJF-RES-2014/00295, de 4/6/2014.

Condeno os três réus (Washington, Lourival e Fabrício), ainda, ao pagamento das custas processuais, na forma do art. 804 do CPP.

Em cumprimento ao disposto no art. 387, § 1º, do CPP, por não estarem presentes os pressupostos para a decretação da prisão preventiva, concedo aos réus Washington, Lourival e Fabrício o direito de apelarem em liberdade.

Fica mantida a cautelar de comparecimento periódico em Juízo para o réu Washington Luiz Cardoso Siqueira. Traslade-se cópia desta sentença para o processo nº 5000923-02.2019.4.02.5102, que deverá ser redistribuído por dependência à ação penal nº 0500797-48.2017.4.02.5102 (migrada do sistema Apolo para o sistema e-Proc).

Nos termos da fundamentação, deixo de fixar valor mínimo para a reparação dos danos causados, com base no art. 387, IV, do CPP.

Os bens acautelados, nos termos da fundamentação, deverão permanecer nos autos físicos.

Autorizo que o MPF extraia do sistema e-Proc cópia das peças necessárias à apuração de eventual crime de falso testemunho cometido pela testemunha Neudy Francisco Geraldes.

Oficie-se ao Juízo da 3ª Vara Federal de Niterói, em referência à ação civil pública por ato de improbidade administrativa nº 0043483-83.2015.4.02.5102, comunicando que foi proferida sentença conjunta, cuja cópia poderá ser consultada e extraída do sistema e-Proc.

Altere-se, no sistema e-Proc, a situação dos réus condenados para “condenado-solto”.

Altere-se, no sistema e-Proc, a situação dos réus absolvidos para “absolvido”.

Intimem-se.

Em relação aos réus condenados, transitada em julgado esta sentença: a) lance-se o nome dos réus no rol dos culpados judiciais no portal da Justiça Federal na Internet; b) expeçam-se as Cartas de Execução de Sentença Penal Definitiva a serem distribuídas para esta 2ª Vara Federal, privativa de execuções penais, no sistema e-Proc; c) proceda-se, com relação aos apenados, ao registro no BDJ – Boletim de Decisão Judicial do Sistema Nacional de Identificação Criminal da Polícia Federal – SINIC, bem como anote-se o resultado do processo no Sistema Estadual de Identificação – SEI; d) comunique-se o resultado do processo ao TRE através do sistema INFODIPWEB; e) intimem-se os réus para que, no prazo de 5 dias, recolham as custas judiciais, sob pena de inscrição em dívida ativa, execução forçada e inclusão do seu nome no CADIN, calculadas no valor de R$ 297,95 (duzentos e noventa e sete reais e noventa e cinco centavos), equivalente a 280 UFIRs, em Guia de Recolhimento da União (GRU) – Unidade Gestora (UG) 090016 – Código de recolhimento 18710-0 – que deverá ser providenciada junto à Caixa Econômica Federal, agência 0174 (Av. Amaral Peixoto, 335, Centro, Niterói/RJ), apresentando o comprovante de pagamento em Juízo.

Ficam os réus cientes de que, na impossibilidade de pagamento, deverão apresentar requerimento da sua hipossuficiência, acompanhado de declaração e documentação comprobatória; f) nada mais a fazer, dê-se baixa e arquivem-se.

Já em relação aos réus absolvidos, transitada em julgado esta sentença: a) anote-se o resultado do processo no Sistema Estadual de Identificação – SEI – e proceda-se ao registro no Boletim de Decisão Judicial do Sistema Nacional de Identificação Criminal – SINIC – da Polícia Federal; b) atualize-se o SNBA, se for o caso; c) nada mais a fazer, dê-se baixa e arquivem-se.

Documento eletrônico assinado por FABRÍCIO ANTONIO SOARES, Juiz Federal, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 2ª Região nº 17, de 26 de março de 2018. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico https://eproc.jfrj.jus.br, mediante o preenchimento do código verificador 510002853066v374 e do código CRC 6efbdee8.

Informações adicionais da assinatura:
Signatário (a): FABRÍCIO ANTONIO SOARES
Data e Hora: 25/6/2021, às 22:29:27

Abaixo, todo o processo e sentença: