Cheguei aos 38 anos e, pela primeira vez, encarei uma verdade que rasga o peito: somos nós, a geração dos 35+, que seguramos o país nas costas, mas ninguém segura a gente.
Somos nós que trabalhamos, cuidamos, educamos, nos viramos para sobreviver… e, ainda assim, carregamos o medo silencioso de não conseguir entregar aos nossos filhos o Brasil que um dia achamos possível.
Queremos o básico: segurança, estabilidade, saúde funcionando, escola decente, oportunidades reais.
E, mesmo assim, a cada dia, esse Brasil parece se afastar como um horizonte que nunca chega.
Vivemos dentro de um país com dois poderes paralelos que se misturam mais do que deveriam:
- a velha política, viciada em privilégios, favores e negociações obscuras;
- e o crime organizado, que hoje não só domina territórios, como também influencia comportamentos, financia narrativas, financia a política e, ainda pior, passou a escolher seus próprios representantes.
Sim, é duro admitir:
o crime organizado não atua apenas nas ruas, mas também nas estruturas que deveriam proteger o cidadão.
Eles financiam influenciadores, impulsionam jogos de azar, criam heróis de mentira… e, em muitos lugares, determinam quem deve subir, quem deve calar e quem deve servir aos seus interesses.
E eu olho ao meu redor e penso:
que país é esse onde o cidadão de bem perde espaço enquanto o poder se rende aos piores?
Hoje, ser honesto virou quase um ato de resistência.
Se você não entra no jogo da malandragem, o sistema te exclui.
Se não tem um padrinho político, não existe.
Se tenta fazer o certo, paga caro, em dinheiro, em desgaste emocional, em frustração.
E dói.
Dói ver tanta gente tentando, estudando, trabalhando, empreendendo, sonhando…
…e sendo empurrada para o abismo de dívidas, medo e insegurança.
Dói perceber que, se algo te acontece, a justiça pode até te culpar por não ter sido “esperta” o bastante para se defender.
O Brasil está adoecendo por dentro.
A violência, o desgoverno, a falta de esperança, a ausência de representatividade…
Tudo isso vira ansiedade, tristeza, depressão.
As pessoas estão perdendo a alegria de viver, e qualquer país que adoece a alma do seu povo está condenado a sangrar.
E aí eu me pergunto:
quem lucra com esse colapso emocional coletivo?
A resposta machuca: gente sem integridade, políticos que querem palco, grupos que querem poder, estrutura, controle.
Poucos me representam.
Já estive em ambientes que me fizeram querer vomitar.
Já engoli minha revolta para não ser retirada de espaços que eu conquistei com dignidade.
Já ouvi discursos vazios mascarados de “ideologia” quando, no fundo, o objetivo era só manipular. Frases ensaiadas como enredos.
Na minha cidade me sinto pouco representada por quem defende os valores que eu acredito.
E, numa das minhas lutas pela inclusão, ouvi de um politiqueiro:
“Se não está satisfeita, venha e faça melhor.”
A vontade de responder veio na hora:
"Eu quero. Eu posso. Eu faço."
Mas a verdade é amarga:
não é só sobre querer, lutar e acreditar é sobre enfrentar um sistema que escolhe quem pode entrar, e quase sempre escolhe quem pode pagar.
O dinheiro compra tudo: narrativa, visibilidade, “popularidade”, campanha...
E num país onde historicamente "o ouro é trocado por quinquilharias" nas mãos erradas, o voto também vira moeda de troca barata.
Hoje faço parte de um partido sério, que acredita na disputa justa.
Mas é difícil competir de igual pra igual quando há gente que posa de oposição enquanto se alimenta da mão de quem deveria denunciar.
Como construir política verdadeira dentro de gabinetes onde a prioridade não é o povo, não é a rua, mas a articulação de poder?
Eu não sei onde o Brasil vai parar, e isso me angustia de verdade.
Mas eu sei onde eu vou ficar: no lado da minha consciência.
Eu continuo no jogo, mesmo cansada, machucada e decepcionada às vezes por ver tantas pessoas ainda sendo enganadas.
Mas sigo sendo quem eu sou.
E, se um dia eu tiver que escolher entre vencer e perder minha essência…
…eu escolho minha essência.
Porque é dela que meus filhos vão se orgulhar.
Texto: Luana Gouvêia (ativista, fundadora do Simplifica Down, mãe atípica, mulher guerreira e exemplar)






