quarta-feira, 15 de outubro de 2025

CARTA ABERTA À SOCIEDADE E ÀS AUTORIDADES CULTURAIS

 Assunto: Irregularidades e falta de transparência nos editais de Ponto de Cultura


Vimos, por meio desta carta aberta, manifestar profunda indignação e preocupação com o rumo que os editais de Ponto de Cultura vêm tomando em diversos estados e municípios brasileiros.

O que deveria ser um instrumento de democratização do acesso aos recursos públicos e de fortalecimento da cultura de base tem sido, infelizmente, alvo de distorções, manipulações e práticas que ferem o princípio da transparência. Hoje, após a reunião das empresas de captação e consultorias culturais da região sudeste verificamos:

Nos últimos resultados divulgados, é possível constatar a aprovação de entidades sem histórico ou atuação comprovada no campo cultural, muitas delas pertencentes a áreas como saúde, psicologia, assistência social e outras que não desenvolvem nenhuma atividade cultural visível.

Basta uma breve consulta às redes sociais e registros públicos para perceber que essas instituições não possuem projetos, ações ou trajetória cultural que justifiquem a obtenção de pontuações máximas, enquanto grupos tradicionais, coletivos periféricos e mestres da cultura popular ficam desclassificados.

Essa situação expõe uma grave falha nos critérios de avaliação e na fiscalização dos processos seletivos, comprometendo a credibilidade dos editais e a confiança da sociedade nas políticas públicas de cultura.

Outro ponto alarmante é o crescimento das chamadas “empresas de captação e consultoria”, que se apresentam como especialistas em editais, mas não conhecem as regras básicas dos mecanismos de fomento. Essas empresas cobram valores abusivos, vendem falsas promessas a artistas e produtores, e em alguns casos interferem indevidamente nos processos de inscrição e seleção, o que configura prática antiética e precisa ser investigada.

Além disso, a demora recorrente nos pagamentos dos projetos aprovados vem causando prejuízos e desmobilização de equipes, afetando diretamente a execução das ações e a sobrevivência de centenas de trabalhadores da cultura. Cada atraso representa o desrespeito à cadeia produtiva cultural, que depende desses recursos para continuar viva.

Diante desses fatos, solicitamos formalmente uma intervenção do Ministério Público, com o objetivo de garantir a transparência e a legalidade dos editais, bem como auditorias independentes sobre os resultados e as comissões de avaliação. É necessário que haja critérios claros, fiscalização efetiva e respeito à trajetória real dos agentes culturais.

Reafirmamos nosso compromisso com a cultura brasileira — viva, plural, diversa e feita por quem está nos territórios, nas comunidades, nas ruas, nas tradições e nas criações cotidianas.

A cultura é um direito constitucional, não um privilégio de poucos. O que está em jogo é a credibilidade das políticas públicas e o respeito a quem dedica a vida a manter a arte como instrumento de transformação e cidadania.

Cultura não é fachada — é identidade, resistência e compromisso com o povo.

Anderson Terra