terça-feira, 18 de abril de 2023

EM ATO SIMBÓLICO, CDMA DA ALERJ EMBARGA OBRAS DA MARAEY. Cacique pronto para guerra!

 ÍNDIO QUER SUAS TERRAS ENTREGUES PELO EX-PREFEITO DE MARICÁ WASHINGTON SIQUEIRA E DIZ QUE PODERÁ CONVOCAR 1000 INDÍGENAS PARA GUERRA


Em atenção às denúncias de danos ao meio ambiente e ameaças aos pescadores artesanais e indígenas no interior da Área de Proteção Ambiental - APA de Maricá, a Comissão de Defesa do Meio Ambiente (Gerhard Sardo) acompanhou mobilização popular motivada pelo Cacique Darci Tupam, liderança da Aldeia Guarani Mbya Mata Verde Bonita.

Um ato simbólico de embargo das obras do empreendimento imobiliário Maraey, aconteceu na terça feira 18. Segundo o Cacique e o CDMA da Alerj, o empreendimento ameaça o equilíbrio dos ecossistemas da região, com base em decisão proferida pelo Superior Tribunal de Justiça, que teria suspendido os efeitos das licenças ambientais emitidas, fato ignorado pela IDB e Maraey, autora do projeto e executante das obras que poderão gerar (se concluídas), cerca de 10 mil empregos na região dentre primários a terceários.

CACIQUE  AMEAÇA GUERRA EM MARICÁ

Com decisão judicial embaixo do braço, cacique Tupã encara operários e seguranças da IDB Brasil, entra na área em que está sendo construído o resort Maraey e afirma:

“Estamos prontos para a guerra, estamos prontos para lutar pelo nosso direito”

“Não vou deixar minha cultura ser pisoteada: se não nos respeitarem, vocês passem as máquinas sobre os indígenas”

“Chamei outras tribos e estaremos com mil indígenas amanhã, aqui, e construiremos nossas ocas"

“Não vou deixar minha cultura ser pisoteada assim. Acaba aqui essa palhaçada. Estamos prontos para a guerra. Se vocês não respeitarem, vão passar a máquina em cima dos indígenas. A ordem está dada.”

Essas foram as palavras do cacique indígena Tupã, líder da Aldeia Mata Verde Bonita, que liderou um protesto pedindo o fim da obra do resort Maraey, em Maricá na manhã da segunda feira (17). Um dos argumentos utilizados pelo cacique é uma suposta decisão do Superior Tribunal de Justiça (STJ), que seria contrária à obra. Em clima de extrema tensão, o indígena pediu reunião com os representantes da IDB Brasil, empresa responsável pela construção, e órgãos ambientais e exigiu aos presentes que a obra deveria ser cancelada na hora. Tupã afirmou que a obra destrói a natureza e afeta diretamente a preservação ambiental em área, que, segundo ele, lhe foi prometida ser de demarcação indígena.

“Nos prometem melhorias e até agora nada. Na minha oca, muita coisa foi prometida, mas não houve nada. Prometeram a demarcação da nossa aldeia. E esses espanhóis acham que vão pisotear na gente. Se essa obra não parar agora, vamos colocar várias ocas aqui. Estamos pedindo reunião com o IDB Brasil, com a prefeitura e tem que ser aqui na aldeia”, afirmou.

Segundo o líder indígena, as obras só fazem destruir toda a natureza ambiental do local. Ao entrar no terreno do empreendimento, o cacique exigiu falar com algum representante. Não foi atendido, mas pôde entrar e mostrou a área para a reportagem. De fato, árvores já foram derrubadas e muita mata já foi queimada.

Além do lado ambiental, a liderança indígena alega que a obra não poderia acontecer por uma questão legal, dizendo que a obra estaria “embargada”. Tratores com o nome Maraey estavam ainda no local com operários presentes. Os índios, em clima pacífico, com jovens, mulheres e crianças mostraram o risco da obra, inclusive áreas onde espécies de abelhas poderiam ser queimadas, atrapalhando apicultores que estão no local há mais de 15 anos. Um pé de boldo foi mostrado como futuro alvo.

Para os indígenas, a derrubada da planta prejudica, já que o chá feito é altamente eficaz contra dores. Para Tupã, o nome Maraey jamais poderia ser usado, já que significa “terra sem mal” ou “paraíso na terra”, na cultura Guarani. O cacique ainda conta que estão sendo impedidos de transitar pelo terreno do empreendimento, chegando a ter uma estrada de acesso bloqueada pelos representantes da obra.

“Essa empresa prejudica nossa vida. Nós já não podemos mais passar para o território para coletar as sementes sagradas e o mel e isso afeta diretamente nosso trabalho de cultivo, alimentação e renda”, afirmou. Tupã disse que outras aldeias foram convocadas e que ocas serão instaladas ali caso a obra permaneça.

SITUAÇÃO DAS ABELHAS

Uma apicultora, que com medo de represálias, não quis se identificar, revelou que as abelhas correm risco de serem extintas dali: “Não só as caixas de abelha estão em risco. Essa área tinha capivaras e outros animais. Me relataram que cobras foram queimadas, estavam caídas mortas. Teve gente que disse que resgatava os animais mortos, mas, pelo contrário, os matava. Cortaram a jiboia em pedaços.

Caixas de abelhas europeias e africanas estão em risco de serem destruídas e queimadas porque elas estão onde estão as máquinas vão passar”, disse. Além da questão relacionada aos animais, o apicultor também demonstrou preocupação com as espécies vegetais nativas da região.

“Aqui estão árvores nativas, não podem ser desmatadas também. A restinga de Maricá é área de preservação ambiental. O presidente Lula prometeu que onde seria área de preservação, não teria construção. E como agora vemos uma construção? A justiça já decidiu. A obra está aqui, destruindo tudo. Ninguém está contente. Povo indígena, apicultores, pescadores, moradores, ninguém quer essa obra”, afirmou

IDB

Em nota, a IDB Brasil reiterou que respeita posições contrárias ao empreendimento e está aberta a debates, mas rebaterá sempre informações falsas, distorcidas ou contrárias à realidade, informa que não há decisão judicial vigente que impeça o desenvolvimento do empreendimento e que, cumprindo todos os protocolos e autorizações dos órgãos competentes, iniciou as obras de infraestrutura do empreendimento em 03 de abril de 2023.

Diz também que não cabe no julgamento do STJ, de 21 de março de 2023, qualquer decisão de cancelamento de licenciamento do empreendimento ou suspensão das obras. O Acórdão proferido pelo Superior Tribunal de Justiça (STJ), analisando questões meramente processuais, indeferiu os agravos interpostos pela IDB Brasil e pelo Município de Maricá, e determinou apenas o prosseguimento da ação na primeira instância do TJRJ.

A fase inicial de trabalhos contempla a instalação de viveiro, além de resgate e manejo de flora e fauna, seguidos da demarcação e da limpeza do viário. As vias principais serão doadas ao município e servirão como importante eixo entre Itaipuaçu, Centro de Maricá e Ponta Negra, reduzindo o impacto do trânsito na rodovia RJ-106 e, também serão doadas às concessionárias dos serviços públicos as redes de infraestrutura executadas.

A IDB Brasil reforçou seu respeito integral à cultura ancestral da Aldeia Tekpa Ka’aguy Hovy Porã (Mata Verde Bonita), que se instalou temporariamente em área privada do empreendimento em 2013, durante o curso do licenciamento do projeto.

A empresa trabalha ao lado das lideranças indígenas da Mata Verde Bonita e de representantes da Prefeitura de Maricá e da FUNAI na busca por uma área definitiva para o assentamento permanente da aldeia, mais adequada às necessidades do grupo, com solo fértil e acesso facilitado à água, como pleiteia a comissão de representantes dos indígenas.

ENTENDA O PROBLEMA

Os debates e o imbróglio a respeito do resort Maraey se arrastam há anos. O empreendimento é localizado na Restinga de Zacarias, que integra a Área de Proteção Ambiental (APA) de Maricá (RJ), a cerca de 60 quilômetros da cidade do Rio de Janeiro, desenvolvido pela empresa espanhola IDB. A área é conhecida como Fazenda São Bento. Engloba uma área de 840 hectares entre a Praia da Barra de Maricá e a Lagoa de Maricá. No local, devem ser instalados hotéis, clubes, shoppings, campo de golfe, centro hípico, prédios e casas residenciais, restaurantes e escola.

Em reportagem de A TRIBUNA, publicada em 2021, o diretor executivo do empreendimento, o espanhol David Galipienzo, disse que a obra deve gerar até 50 mil empregos. Após a conclusão, o Maraey deve gerar ainda mais 36 mil vagas de emprego diretos e indiretos. Sendo assim, os primeiros edifícios seriam entregues no final de 2024. O investimento privado total será na ordem dos R$ 11 bilhões, com arrecadação de impostos de R$ 7,2 bilhões e mais de 56 mil empregos durante os primeiros 14 anos (construção e consolidação de vendas), além de R$ 1 bilhão de arrecadação anual na operação.

O QUE DIZ O INEA

O Instituto Estadual do Ambiente (INEA) afirmou que a 3ª Câmara de Direito Privado (antiga 18ª Câmara Cível) reconheceu a nulidade da decisão proferida pelo juízo da 2ª Vara Cível da Comarca de Maricá, que determinou o cancelamento de licença ambiental e alvará de construção já concedidos. Dessa feita, nos limites do acórdão proferido, não subsiste ao INEA, no momento, a obrigação de realizar o cancelamento das licenças concedidas em favor do IDB-Brasil, referentes ao empreendimento objeto dos autos. Ou seja, para o INEA, a obra está regular.

O órgão ambiental estadual disse que concedeu a Licença de Instalação para as obras civis da rede viária e desenho urbano, bem como Autorização Ambiental para o manejo de fauna e eventual supressão de vegetação, de acordo com a legislação vigente. O INEA ressaltou que o empreendimento foi concebido respeitando o Plano de Manejo da Área de Proteção Ambiental (APA) de Maricá, unidade de proteção de uso sustentável.

O QUE INFORMA O STJ

Procurado, o Superior Tribunal de Justiça afirmou que seu entendimento é de que cada ação a respeito desse assunto deve ser tratada pela Justiça do Rio, no foro onde foram ajuizadas as ações. A última decisão do ministro Herman Benjamin decidiu que não havia litispendência, sendo que cada uma deve ser julgada por si. Litispendência ocorre quando duas ações que possuem as mesmas partes, as mesmas causas e os mesmos pedidos são ajuizadas, fazendo com que existam dois processos simultâneos sobre um mesmo tema.

A reportagem também pediu posicionamento da Prefeitura de Maricá, do Ministério dos Povos Indígenas. Até o fechamento deste texto, não tinham sido enviadas respostas.

Baseado em matéria do jornal A TRIBUNA de 18 de abril de 2023 - reportagem de LEONARDO OLIVEIRA BRITO