quinta-feira, 13 de dezembro de 2018

MP-RJ FAZ RELATÓRIO SOBRE USO DE ROYALTIES EM MARICÁ E NITERÓI. PREFEITURA DE MARICÁ CONTESTA INFORMAÇÕES


O Ministério Público do Estado do Rio de Janeiro (MPRJ) por meio do Laboratório de Análise de Orçamentos e de Políticas Públicas (LOPP/MPRJ) apresenta o estudo “Análise da Evolução das Receitas das Participações Governamentais Petrolíferas (PGs) para dois municípios que Compõem o Núcleo Niterói de Tutela Coletiva: Maricá e Niterói”, que mostra que as duas cidades possuem elevado grau de dependência das suas receitas às PGs. Com o fim de oferecer às promotorias de Justiça com atribuição material analítico relativo às finanças dos municípios, o documento analisou a evolução das PGs para os dois municípios entre os exercícios de 2013 e 2018.

O levantamento, que levou em conta informações obtidas junto ao Tribunal de Contas do Estado do Rio de Janeiro (TCE-RJ) e à Agência Nacional do Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis (ANP), considerou como PGs a soma dos royalties com as participações especiais recebidas pelos municípios. A análise se desdobrou em duas vertentes: a primeira investigou aspectos legais referentes à aplicação dos royalties, enquanto a segunda se dedicou à produção de informações gerenciais sobre a arrecadação e a aplicação das PGs.

Um dos problemas verificados pelo corpo técnico do LOPP/MPRJ, com base na análise do Corpo Instrutivo do TCE-RJ no processo de prestação de contas do Município de Maricá relativo ao exercício de 2016 (nº 205.818-3/17, fls. 1179), consistiu na constatação de que o valor empenhado com recursos dos royalties foi bastante superior ao arrecadado, revelando inexatidão no processo de planejamento. “Verifica-se que o município procedeu ao empenhamento de despesas à conta de recursos de royalties no valor de R$ 329.259.375,08, montante consideravelmente superior ao valor de fato recebido (R$ 170.043.145,87). Tal fato pode revelar inexatidão no planejamento que resulta em desequilíbrio financeiro do município, podendo ocasionar déficit ao final do exercício, não sendo observadas, assim, as normas estabelecidas pelos artigos 1º e 12 da Lei Complementar Federal 101/00, a Lei de Responsabilidade Fiscal”, diz trecho do processo do TCE-RJ.

Com relação às variações das PGs no período 2013-2017, o estudo revela que, em sentido inverso ao ocorrido com o Estado do Rio de Janeiro e grande parte dos municípios fluminenses, os Municípios de Maricá e Niterói obtiveram um ininterrupto crescimento das rendas petrolíferas mesmo no período 2014-2016, em que a cotação internacional do petróleo caiu de US$ 115/barril para US$ 35/barril. Tal trajetória deveu-se, sobretudo, à produção de petróleo do Campo de Lula, inserido na área formada pelas projeções dos limites municipais de Maricá e Niterói na plataforma continental.

Em função disso, Maricá teve as receitas de PGs triplicadas no período (292,7%), enquanto Niterói experimentou uma elevação de 254,7%. Entre os anos de 2016 e 2017, o ritmo de crescimento das PGs para os municípios foi ainda mais acentuado, certamente acelerado pela elevação do preço internacional do barril de petróleo. Maricá observou uma elevação de 133,5% nas receitas de PGs enquanto Niterói viu praticamente dobrar suas receitas no período (99,5%). E ao aproximarmos a análise para o período mais recente, comparando janeiro-setembro/2018 com o mesmo período do ano anterior, observa-se trajetória de pleno crescimento das PGs para ambos os municípios: Niterói com crescimento de 94,9% e Maricá de 79,2%.


Porém, com relação ao grau de dependência dos municípios em relação às PGs para os exercícios de 2013 e 2017, que variou entre 8,6% (Niterói, 2013) e 64,9% (Maricá, 2017), ficou demonstrado um quadro preocupante de sujeição da solvência financeira dos municípios às rendas petrolíferas.

Entre 2013 e 2017, tendo suas receitas com rendas petrolíferas praticamente quadruplicadas, passando de R$ 190,2 milhões (2013) para R$ 746,8 milhões (2017), Maricá aumentou as despesas com pessoal em 55%, indicando um procedimento temerário de elevar substancialmente despesas correntes para fazer frente a gastos com pessoal, baseado no influxo de uma receita errática, variável e finita, como as provenientes das compensações financeiras petrolíferas. Como parâmetro para determinar o crescimento incomum das despesas com pessoal de Maricá, vale registrar que, no mesmo período, o conjunto dos 92 municípios fluminenses reduziu estas despesas em 4%.

As despesas com pessoal do Município de Niterói , houve elevação de 11% no período 2013-2017, significativamente menor do que o apurado na gestão de Maricá, mas superior à média dos municípios fluminenses.
De acordo com o estudo, seria prudente, a título sugestivo, que, em função do elevado grau de dependência das receitas totais em relação às PGs, os gestores de Niterói e Maricá fossem alertados quanto ao risco de alocarem as receitas petrolíferas em despesas de custeio, sob pena de se tornarem insolventes na hipótese de um novo quadro de redução da cotação internacional do petróleo.

O LOPP/MPRJ ainda alerta que, no primeiro ano do mandato 2017-2020, Maricá ampliou seus investimentos em proporção muito inferior ao crescimento das suas rendas petrolíferas, enquanto Niterói operou uma redução drástica nessas mesmas despesas. “Tal prática é ainda mais gravosa em um momento de alta dos preços do petróleo, posto que o excesso de arrecadação ditado pelas rendas petrolíferas resulta em um crédito adicional suplementar que poderia ser aportado em despesas de investimentos. Já em uma conjuntura de insuficiência de arrecadação, não sobrará reserva de recursos para investimentos”, diz o texto do relatório.

O estudo faz parte de uma série que acompanhará todos os municípios fluminenses beneficiados com PGs entre 2013 e 2017. Os dados contidos no documento foram enviados para o Centro de Apoio Operacional das Promotorias de Justiça de Tutela Coletiva de Defesa da Cidadania (CAO Cidadania/MPRJ), que os encaminhou para a Promotoria de Justiça de Tutela Coletiva de Defesa da Cidadania do Núcleo Niterói, para a adoção das providências necessárias.


Prefeitura de Maricá contesta relatório do MP sobre uso dos royalties


O secretário de Planejamento, Orçamento e Gestão de Maricá, Leonardo Alves, contestou nesta quarta-feira (12/12) o relatório do Ministério Público estadual, divulgado na terça-feira, que apontou uma suposta “dependência” financeira do município das receitas provenientes das chamadas Participações Governamentais (PG). Tais participações incluem principalmente o repasse dos royalties e das Participações Especiais a quem a cidade tem direito por ter status de município produtor de petróleo. O MP baseou a avaliação da “dependência” em função, entre outros itens, da observação simples da diferença entre o que o município tem de arrecadação própria, o que recebe de royalties e PEs e as despesas de custeio que realiza.

“A leitura dessa forma é superficial e não retrata a realidade financeira e orçamentária de Maricá”, discorda o secretário. “Seria impossível acompanhar, na mesma proporção, o aumento dos recursos de royalties. As PGs quintuplicaram de 2013 para cá e a nossa receita própria dobrou”, diz. “Como o repasse de royalties é uma variável dessa equação que não controlamos porque depende de produção, a proporção entre isso e o que arrecadamos acaba gerando um número descontextualizado que embute uma distorção considerável”, completa, referindo-se ao índice de 65% de “dependência” apontado pelo MP.

Segundo Leonardo Alves, Maricá melhorou e modernizou substancialmente o processo de arrecadação tributária desde 2017, mantendo o aporte e a base de arrecadação em crescimento constante, isso sem a aplicação de reajustes de impostos. A melhoria se deu, também, em função de correções obtidas, por exemplo, no índice do repasse municipal previsto no ICMS. “Provamos à Petrobras que ela fazia a declaração de forma incorreta e, depois de um ano, o patamar desse repasse foi mudado. Éramos o 40º município em termos desse repasse e, com base na correção, passamos para a 7ª posição entre os 92 municípios do estado”, conta.

Outra indicação do relatório do MP diz respeito ao crescimento de 55% nas despesas com pessoal, mais um número que precisa ser contextualizado antes de uma avaliação negativa. “Trata-se de um município grande em termos geográficos, mas ainda pequeno no que diz respeito à relação entre população e as demandas do crescimento econômico”, analisa o secretário, citando como exemplo a contratação de professores para as 61 escolas da rede pública municipal, o pagamento de um piso salarial ao magistério acima do piso nacional e a contratação de médicos e profissionais de Saúde para equipar as mais de 30 unidades da rede – o que inclui um hospital, uma UPA e dezenas de postos.

Ainda para Leonardo Alves, o uso dos recursos da exploração do pré-sal na cidade vem sendo tratado como um investimento para o futuro. “Gastamos em projetos estruturantes e ainda assim, dentro de um rigoroso planejamento de longo prazo. Do que recebemos entramos em 2018 com R$ 450 milhões em caixa e temos, hoje, R$ 800 milhões para aplicação em políticas estruturantes e ações para o desenvolvimento sustentável”, descreve. O principal exemplo é o projeto de captação de água e de saneamento, uma parceria do município com a Cedae através da qual Maricá custeará o projeto de R$ 400 milhões que prevê uma barragem em Tanguá, 23 quilômetros de adutoras, quatro novas estações de tratamento de esgotos e a implantação de galerias de cintura para evitar o despejo de esgoto no complexo lagunar da cidade. “E apesar desse investimento, ainda estamos alocando os recursos previstos para o Fundo Soberano de Maricá, que deve entrar em 2019 com R$ 100 milhões em caixa, aplicados para rendimento em bancos públicos”, descreve. O rendimento do fundo só deverá ser usado quando a produção e o repasse de royalties começar a declinar e a previsão é a de que o montante passe de R$ 1,1 bilhão em 10 anos.