Em troca da liberdade, foram postas as condições de que os parlamentares abram mão de seus mandatos, não ocupem os gabinetes na Alerj e não recebam salários
Por 39 votos a 25, a Assembleia Legislativa do Rio (Alerj) decidiu nesta terça-feira soltar da cadeia os deputados estaduais André Corrêa (DEM), Luiz Martins (PDT), Marcus Vinicius Neskau (PTB), Marcos Abrahão (Avante) e Chiquinho da Mangueira (PSC) - este último em prisão domiciliar -, presos na Operação Furna da Onça, em novembro do ano passado. Numa sessão extraordinária tensa, com manifestações do público nas galerias, algumas bancadas, como a do PSL, do presidente Jair Bolsonaro, acabaram rachando.
Os parlamentares votaram depois de, na segunda-feira, a Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) da Casa ter costurado um projeto para a soltura. Em troca da liberdade, foram postas as condições de que os parlamentares abram mão de seus mandatos, não ocupem os gabinetes na Alerj e não recebam salários.
Logo no início da sessão, deputados favoráveis à soltura argumentaram que não estavam decidindo sobre a culpabilidade de seus pares acusados, mas sobre a legalidade das prisões.
— (Julgar) o mérito cabe único e exclusivamente ao Judiciário — disse o deputado Rodrigo Bacellar (Solidariedade). — Não vou atropelar a lei — continuou.
Um dos primeiros a tomar a palavra, o deputado Chico Machado (PSD), que também votou pela soltura, provocou diferentes reações das galerias.
— Há alguma condenação em primeira ou segunda instância (contra os deputados acusados)? — perguntou, para ouvir a resposta "não" em seguida. — Não estaremos inocentando ninguém — concluiu, sob aplausos de parte dos presente e vaias dos outros.
Logo depois, o deputado Luiz Paulo (PSDB) manifestou seu voto pela manutenção da prisão, citando posições de desembargadores e procuradores pela restrição da liberdade dos cinco acusados. E afirmou que o material colhido nas denúncias deixa os parlamentares da Casa, como um todo, constrangidos.
— Competíamos a nós votarmos. Cumpri o meu dever e acho que nós, parlamentares, não conhecemos de direito criminal e nem somos do Poder Judiciário para julgar um feito dessa relevância. Então, votei de acordo com a minha consciência — disse ele, ao fim da sessão.
PSL dividido, PT a favor da soltura
A responsabilidade pela decisão passou a ser da Alerj após a ministra Carmen Lúcia, do Supremo Tribunal Federal (STF), ter dado prazo de um dia para que a Casa decidisse sobre o que seria feito com os parlamentares acusados — prazo que alguns parlamentares disseram ter sido muito curto para tomar uma decisão tão importante.
Eram necessários 36 votos para aprovar a revogação da prisão, número que foi superado por uma pequena margem. Maior bancada da Alerj, com 12 representantes no Poder Legislativo estadual, o PSL se dividiu. Enquanto sete deputados votaram “não” ao projeto de resolução que encaminhou a soltura dos parlamentares acusados de corrupção, quatro membros do partido optaram pelo “sim” — tese vitoriosa.
Alana Passos, Anderson Moraes, Dr. Serginho, Filipe Poubel, Marcelo do seu Dino, Márcio Gualberto e Rodrigo Amorim foram os votos contrários ao projeto. Votaram com a maioria da Casa os parlamentares Coronel Salema, Gil Vianna, Gustavo Schmidit e Renato Zaca. O deputado Alexandre Knoploch foi o único do partido que não votou porque está licenciado.
O PSL, no entanto, não foi o único partido a votar dividido. Dos cinco representantes do DEM, dois foram favoráveis à soltura ( Dr. Deodalto e Samuel Malafaia) e Filipe Soares foi contrário, enquanto Carlo Caiado e Fábio Silva não compareceram à sessão. Os três representantes do PDT também não fecharam questão. Marta Rocha votou “não”. Já Sérgio Fernandes e Thiago Pampolha foram favoráveis. No PSDB, Luiz Paulo foi o voto contrário, e Lucinha votou a favor.
Na contramão das bancadas que racharam, o PT votou de forma coesa: os três deputados (André Ceciliano, presidente da Alerj, Waldeck Carneiro e Zeidan Lula) votaram “sim”.
Os três deputados do PSC — partido do governador Wilson Witzel e do deputado Chiquinho da Mangueira, um dos beneficiados com a decisão — votaram “sim”: Bruno Dauaire, Márcio Pacheco e Sergio Louback. O MDB, partido do ex-governador Sérgio Cabral e do ex-presidente da Alerj Jorge Picciani, foi pelo mesmo caminho. Os cindo parlamentares da legenda votaram “sim”: Franciane Motta, Gustavo Tutuca, Márcio Canella, Max Lemos e Rosenverg Reis.
Já os cinco deputados do PSOL (Dani Monteiro, Eliomar Coelho, Flavio Serafini, Mônica Francisco e e Renata Souza) e os dois do Novo (Alexandre Freitas e Chicão Bulhões) fecharam questão pelo voto contrário. Em nota após a sessão, o PSOL divulgou a decisão tomada pelo plenário.
"A rigor, este deputados já deveriam ter sido cassados. (...) Na sessão de hoje, a omissão resultou na revogação da prisão preventiva dos deputados, expressando uma resolução frágil e passível de questionamento judicial, sem que o conjunto dos deputados da Casa tivessem acesso aos autos, e que pode redundar no retorno imediato dos mesmos ao parlamento", afirmou a nota.
— Entendemos que a votação foi importante para restabelecer o equilíbrio entre os poderes. Mas, agora, com relação ao mérito, a gente seguiu a posição da Justiça, por entender que a própria Alerj tem dado mostras de como esses deputados continuam poderosos e blindados, transformando a imunidade parlamentar numa verdadeira impunidade — reforçou o deputado Flávio Serafini.
Chicão Bulhões (Novo) também criticou o resultado.
— A gente tinha a oportunidade de mandar uma recado inequívoco de que esta Casa não será mais tolerante com a corrupção. Imunidade não é nem deve ser sinônimo de impunidade e privilégio — disse.
Além de Alexandre Knoploch (PSL), Tia Ju (PRB) e Dionisio Lins (PP) não votaram, por estarem licenciados. Capitão Nelson (Avante) estava presente, mas não votou.
Justiça terá que expedir alvará de soltura
Agora, ainda não há prazo para a libertação dos deputados, mas não ocorrerá nesta terça-feira. O parecer favorável à libertação dos deputados bem como o resultado do plenário serão, primeiro, publicados na edição desta quarta-feira do Diário Oficial do legislativo. Em seguida, serão expedidos ofícios oficializando a decisão ao Tribunal Regional Federal (TRF) e ao Supremo Tribunal Federal (STF). Depois, o alvará de soltura terá que ser expedido pelo desembargador Abel Gomes, relator da Furna da Onça.
— Estamos satisfeitos com a decisão. Meu cliente é inocente e isso será demonstrado no processo. sobre a possibilidade de tomar possem ainda não discuti isso com meu cliente. a conveniência disso será avaliada — disse Rafael Faria, advogado de Chiquinho da Mangueira (PSC).
Conforme O GLOBO apurou, as defesas dos deputados acusados não devem aceitar a decisão da Casa e tentarão garantir que eles assumam seus mandatos em um processo que está em curso no TJ-RJ, sob o argumento de que uma resolução da Alerj não pode se sobrepor a uma regra da Constituição.
Antes da votação, integrantes do MBL do Rio abriram uma faixa nas escadarias do Palácio Tiradentes com a frase "O STF é uma vergonha". Nas tribunas do plenário, algumas pessoas carregavam placas com a frase "corrupto vota em corruptos".