quarta-feira, 11 de janeiro de 2017

Acordo da União com estado prevê redução de vencimentos e de jornada de trabalho de servidores


O acordo que a equipe econômica do governo federal negocia com o Rio para socorrer as finanças estaduais inclui redução tanto da jornada de trabalho, quanto dos salários dos servidores públicos. A medida foi proposta pelo governador Luiz Fernando Pezão, como forma de aliviar as contas fluminenses, e tem a simpatia do Tesouro Nacional. Também estão sobre a mesa a venda da Cedae num prazo de até dois anos, a extinção de outras empresas estatais e cortes de gastos (com a suspensão de reajustes e de concursos públicos).

Segundo integrantes da equipe econômica, o acordo deve ser fechado até esta quinta-feira, quando será levado ao presidente Michel Temer e, depois, ao Supremo Tribunal Federal (STF) para homologação. O plano será apreciado pela presidente da Corte, ministra Cármen Lúcia. Caso ela aceite seus termos, será levado adiante, mas, no caso específico da redução da jornada e dos salários, o tema ainda precisará ser analisado pelo plenário do STF.

O acordo prevê ainda a suspensão do pagamento das dívidas do Rio com a União por um prazo de três anos, bem como a possibilidade de o Tesouro Nacional dar garantias a empréstimos para o governo estadual destinados a objetivos específicos, como a realização de um programa de demissão voluntária. Como contrapartida, além do corte de despesas e da venda ou do fechamento de estatais, teriam que ser adotadas medidas que haviam sido propostas pelo governo federal no projeto de renegociação das dívidas dos estados com a União enviado ao Congresso Nacional, mas que acabaram retiradas do texto aprovado pelos parlamentares, em 20 de dezembro passado. Entre as exigências derrubadas, estava, por exemplo, o aumento da contribuição previdenciária dos servidores de 11% para 14%.

ALERJ TEM QUE APROVAR PLANO EM ATÉ 120 DIAS

As contrapartidas terão que ser aprovadas pela Alerj num prazo de até 120 dias. No entanto, segundo integrantes do governo, quando o acordo for homologado pelo STF, a suspensão dos pagamentos das dívidas pelo estado já poderá entrar em vigor.

— Existe uma postura de cooperação. Estão sendo negociadas medidas como cortes de despesas e redução do número de estatais. O acordo tem que dar uma solução para o estado, a fim de resolver o problema por tempo suficiente para a economia se recuperar — disse um integrante da equipe econômica.

Nesta terça-feira, o procurador-geral do estado, Leonardo Espíndola, se reuniu com a equipe do Tesouro Nacional para acertar os termos do acordo. Pezão embarcou para Brasília em seguida, para acertar os últimos detalhes com o ministro da Fazenda, Henrique Meirelles.

Pezão está preocupado porque a redução da jornada de trabalho e dos salários ainda não foi julgada pelo STF. Uma liminar, concedida em ação direta de inconstitucionalidade, suspendeu o artigo da Lei de Responsabilidade Fiscal (LRF) que autoriza essas duas medidas, no caso de o governo gastar com pessoal acima do limite permitido. A ministra Cármen Lúcia já teria se comprometido a incluir o tema na pauta do plenário assim que terminar o recesso forense, em fevereiro. Se o Supremo aprovar as medidas, seria uma forma de garantir a legalidade desse ponto do acordo.

A decisão de buscar a homologação pelo STF é inédita. Qualquer medida prevendo mudanças na forma de pagamento das dívidas de estados com a União requer uma alteração da Lei de Responsabilidade Fiscal — portanto, precisa necessariamente passar pelo Congresso. No entanto, técnicos do governo avaliam que o quadro é urgente e que não se pode esperar tanto tempo. Eles afirmam que cabe ao Supremo decidir se há base jurídica para o acordo.

Pezão já manifestou a assessores próximos preocupação com o fato de várias propostas que devem constar do plano esbarrarem na LRF. Mas uma chancela da presidente do STF evitaria que o acordo fosse alvo de questionamentos jurídicos e evitaria novos conflitos. Esse tipo de aval não é comum, nem está previsto no ordenamento jurídico. Segundo interlocutores do governador, a inovação será necessária por causa do momento de crise financeira aguda. Cármen Lúcia concorda.

Para os demais estados em crise, como Rio Grande do Sul e Minas Gerais, o caminho aberto por um acordo com o Rio também seria favorável, avaliam técnicos do governo.

Nos primeiros dias do ano, a ministra concedeu duas liminares para evitar o bloqueio de R$ 374 milhões das contas do Rio. Os recursos seriam confiscados pela União para garantir o cumprimento de contrapartidas previstas em acordos com o estado. Na segunda-feira, a ministra concedeu liminar para paralisar o andamento do processo sobre o bloqueio dos recursos, mas manteve a validade das liminares. Com a paralisação do processo, o STF fica impedido de tomar novas decisões no caso. A decisão serve como um recado de que o Supremo vai aguardar um acordo entre estado e União, para não aumentar ainda mais o conflito.

CONTRAPARTIDAS RETIRADAS DE PROJETO

No fim do ano passado, o Congresso aprovou um projeto que previa a renegociação das dívidas de estados com a União e que trazia um programa de recuperação fiscal para aqueles em pior situação. A ideia era que eles ficassem três anos sem pagar suas dívidas com o governo federal, em troca de duras contrapartidas, como cortes de gastos com pessoal e a criação de um programa de desestatização. Os parlamentares, no entanto, retiraram as contrapartidas exigidas, o que levou o presidente Michel Temer a vetar essa parte do texto. Um novo projeto será enviado ao Legislativo.

Nesta terça-feira, a presidente do Supremo Tribunal Federal negou uma liminar ao governo de Minas Gerais para impedir o bloqueio de R$ 1,5 bilhão das contas do estado. Com a decisão, o Banco do Brasil poderá obter o dinheiro para recompor o fundo de reserva dos depósitos judiciais, que o governo teria gasto além do permitido. Embora a administração de Fernando Pimentel (PT) tenha decretado a calamidade financeira, Cármen Lúcia não se sensibilizou com a situação.

Em outubro de 2015, o STF suspendeu uma lei estadual que permitia a transferência de depósitos judiciais para o governo. Para o Supremo, há incompatibilidade com a norma federal que prevê o uso de depósitos apenas das ações nas quais o estado seja parte. Esse uso estaria limitado a 70% do valor total, com a necessidade de deixar 30% como saldo de reserva.

Em dezembro, o Banco do Brasil notificou o governo mineiro sobre a insuficiência de saldo no fundo de reserva, solicitando sua recomposição. O dinheiro seria necessário para garantir o pagamento dos valores dos resgates de depósitos judiciais relativos às decisões da Justiça de Minas Gerais referentes aos recursos já repassados. O governo mineiro alegou que o banco fez um “artifício contábil” para calcular a dívida do estado com o fundo.

Na decisão, a presidente do STF explicou que as informações prestadas pelo Banco do Brasil e pelo governo de Minas Gerais eram divergentes. Enquanto a instituição afirmou que não tem saldo suficiente no fundo de reserva dos depósitos judiciais, o estado insiste que o dinheiro está disponível. Seria necessário apurar melhor o caso.

ESTADO RESISTE A VENDER CEDAE

O governador Pezão sempre disse ser contra a venda ou a concessão da Cedae. No ano passado, no entanto, o estado acenou com um projeto para entregar à iniciativa privada o serviço de esgoto de 11 dos 64 municípios atendidos pela empresa. Hoje a Cedae executa um programa de ampliação e melhora no abastecimento de água da Região Metropolitana, com crédito contratado de R$ 3,4 bilhões junto à Caixa Econômica Federal, o que permitiria dobrar a receita em cinco anos. Esse é um dos motivos pelos quais o governo não abre mão de manter a distribuição de água sob controle da estatal. Mais de 80% do faturamento da Cedae vem da cidade do Rio.